Sob a relatoria do desembargador Rogério Coutinho, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, em reexame necessário, decidiu reformar a sentença proferida pelo juiz Cesar Rodrigo Iotti, da Vara Única da Comarca de Alpinópolis, relativa à emissão de liminar que acatou um mandado de segurança impetrado pelo prefeito Júlio César Bueno da Silva, o Júlio Batatinha (PTB), visando suspender os trabalhos de uma CEI (Comissão Especial de Inquérito) instalada pela Câmara Municipal. A comissão tinha por objetivo investigar o prefeito por supostas fraudes cometidas em sua administração, notadamente o superfaturamento na compra de massa asfáltica e ilegalidades na contratação de serviços de máquinas e caminhões.
O acórdão do TJMG pode resultar na reativação da CEI, porém o prefeito tem prazo de 15 dias para contestar a decisão dos desembargadores e tentar manter o processo paralisado.
A REFORMA
Segundo o relator, no caso, o juiz de primeiro grau entendeu que os fatos que embasaram a constituição da Comissão Especial de Inquérito não eram determinados, razão pela qual sua criação padecia de ilegalidade.
O desembargador deu destaque à importância de verificar se os fatos que embasaram a constituição da Comissão Especial de Inquérito eram determinados ou não. Entendendo que as justificativas constantes nos requerimentos de criação da Comissão Especial de Inquérito esclareceram os fatos a serem investigados, inclusive especificando os agentes e empresas a serem averiguados, a decisão foi por denegar o mandado de segurança e, consequentemente, a reforma da sentença.
Em acordo com o relator votaram também os desembargadores Paulo Balbino e Ângela de Lourdes Rodrigues.
O MINISTÉRIO PÚBLICO
Já na 2ª Instância, em sua análise do caso, o Ministério Público Estadual opinou pela reforma da sentença com a denegação da segurança, pois houve entendimento que as justificativas constantes nos requerimentos de criação da Comissão Especial de Inquérito esclareceram os fatos a serem investigados. “No caso em espécie, vê-se que o requerimento apresentado trata de locação de caminhões e máquinas feitas pelo executivo municipal e da existência de pagamentos desproporcionais aos serviços, que alcançaram altas cifras, lesando o erário público. Já o outro requerimento trata da compra de massa asfáltica, com possível superfaturamento e da pintura de ligação, feita pela prefeitura municipal”, declarou o procurador.
ENTENDA O CASO
A Câmara Municipal de Vereadores instalou, na reunião ordinária realizada dia 19 de maio de 2014, dois processos investigativos para apurar suspeitas de irregularidades no governo de Júlio Batatinha. Os procedimentos instaurados, cuja denominação formal é Comissão Especial de Inquérito (CEI), objetivavam averiguar um suposto superfaturamento na compra de Concreto Betuminoso Usinado Quente (CBUQ), popularmente conhecido como massa asfáltica, e também possíveis ilegalidades na contratação de empresas fornecedoras de serviços de locação de caminhões e máquinas.
Os vereadores José Acácio Vilela (PSDB), Jaqueline Cândida Rocha (DEM) e Luiz Antônio Paiva Oliveira (PRB), apresentaram os requerimentos de implantação das CEIs ao plenário do Poder Legislativo baseando-se em fatos levantados através de evidências materiais e dados colhidos na documentação disponibilizada pela prefeitura no Portal da Transparência Municipal. Foram duas as comissões constituídas e, na oportunidade, batizadas pelos parlamentares como “CEI das Horas de Máquina” e “CEI da Massa Asfáltica”. Após os procedimentos regimentais ficou acordado pelo plenário que ambas seriam fundidas em apenas uma para dar praticidade aos trabalhos.
No início do mês de junho de 2014 foi emitida pelo magistrado local, a pedido de Júlio Batatinha, uma liminar concedendo mandado de segurança, a fim de reconhecer a nulidade da Portaria 005/2014 e Resolução 002/2001, da Câmara do Município de Alpinópolis, e determinar às autoridades coatoras a imediata extinção da Comissão Especial de Inquérito por ela instituída.
Na oportunidade o prefeito alegou haver antijuricidade no requerimento apresentado pelos denunciantes. Logo após conseguir a liminar, Júlio Batatinha declarou à imprensa que houve irresponsabilidade dos vereadores e que tudo não passou de uma questão política, porém não deu nenhum tipo de explicação sobre as suspeitas que foram levantadas sobre as irregularidades em sua administração, limitando-se a dizer que gastou com essas ações menos que a administração passada e que ruas em situação precária estão agora recebendo asfaltamento. Disse ainda que iria, inclusive, buscar uma maneira de processar os parlamentares denunciantes por considerar as acusações irresponsáveis e feitas exclusivamente com fins políticos.
O QUE É UMA COMISSÃO ESPECIAL DE INQUÉRITO
A Comissão Especial de Inquérito é uma delegação nomeada pela Câmara de Vereadores, composta por membros desta, que age em seu nome para realizar um inquérito ou investigação sobre determinado objeto. Esse objeto pode ser um fato isolado ou um conjunto deles, sendo alusivos a acontecimentos políticos, a abusos ou a ilegalidades.
A CEI, que é correspondente a uma CPI no âmbito nacional, tem sua instalação prevista na legislação federal (parágrafo 3º do artigo 58 da CF) e municipal (artigos 50 e 51 da LOM e artigos 67 e 68 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Alpinópolis). Para seu estabelecimento é necessário que 1/3 dos vereadores apresentem requerimento e, depois de instalada, deve ser composta por três membros, sendo um de cada bancada com representação na Câmara, os quais elegerão um presidente e um relator. A CEI funcionará por prazo determinado, prorrogável a juízo do plenário, desde que dentro da mesma legislatura, à qual funcionará na sua sede, com poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que se promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.
AS SUSPEITAS
De acordo com a vereadora Jaqueline são vários os fatores que indicam irregularidades e levaram à instalação da CEI. Em relação à contratação de caminhões e máquinas, ela explica que as dúvidas surgiram em virtude de uma grande quantidade de dinheiro consumida em determinadas ações executadas em 2013 pelas pastas agora investigadas e, além dos gastos, também foram verificados indícios de possíveis irregularidades na contratação de empresas para prestação desse serviço pela Prefeitura Municipal. Outro fator que causou estranheza à vereadora foi o fato dos pagamentos dessa natureza de despesas não terem diminuído mesmo após a chegada das novas máquinas e caminhões para compor a frota da Prefeitura de Alpinópolis. Quanto à aquisição de massa asfáltica, a parlamentar declara que as suspeitas eclodiram no ano passado, quando a administração passou a cobrir com massa asfáltica até buracos existentes nas ruas pavimentadas com bloquetes. A partir daí a documentação referente a essas despesas passou a ser analisada e muitas evidências sobre um provável superfaturamento desse produto começaram a aparecer. “Verificando a quantidade de CBUQ (massa asfáltica) adquirido e também outros detalhes do contrato firmado entre a empresa fornecedora e a Prefeitura de Alpinópolis, concluímos que pode ter ocorrido um superfaturamento deste produto, pois o documento diz, em sua cláusula quarta, que o valor pago por tonelada de CBUQ é de R$ 402,00. Na época, pesquisando os números do banco de preços declarados no próprio contrato (SETOP no Governo Estadual e SINAPI no Governo Federal) calculamos, com o auxílio de um profissional da área, que o preço referencial da tonelada sairia por cerca de R$ 240,00. Isso aponta para uma diferença gritante de, em média, R$ 162,00 a cada tonelada, o que configuraria o superfaturamento suspeitado. Isso sem falar na quantidade absurda de massa asfáltica gasta em tão pouco tempo, algo em torno de 650 toneladas. Existem também outras desconfianças relativas aos casos que serão apuradas durante as investigações que, se tudo correr bem, poderão acontecer com a reativação das CEI”, argumenta a parlamentar.
REATIVAÇÃO DA COMISSÃO
A vereadora diz estar animada com a possível reativação da CEI e afirma ter em mãos todos os documentos que apontam para os indícios de ilegalidades citados nos requerimentos apresentados à Câmara, ou seja, os dados que indicam o possível superfaturamento da massa asfáltica e das irregularidades nas contratações de caminhões e máquinas. “Vamos tomar todas as providências e lutar para que a CEI possa ser reativada o mais rápido possível. Foi realmente uma pena a interrupção ocorrida no ano passado, pois os indícios existem e temos documentos em mãos que respaldam as denúncias. A reforma da sentença pelo TJMG nos trouxe ânimo para levar adiante os trabalhos paralisados, já que reunimos documentos desde o começo de 2014 e conseguimos cruzar todos os dados para embasar a investigação. Sabemos da importância de dar sequencia ao processo, pois é nosso dever levar essa averiguação até o fim, seja para declarar o prefeito culpado ou para inocentá-lo”, declarou a parlamentar.