O Protocolo de Manchester em Alpinópolis

Prática muito comum e largamente difundida em várias localidades do Brasil e do mundo (principalmente em cidades do porte de Alpinópolis), é a de transformar o pronto-socorro em uma espécie de consultório médico. O atendimento, que deveria ser direcionado aos pacientes urgentes, acaba sendo um filtro entre o emergencial e o ambulatorial, sobrecarregando dessa forma um setor destinado unicamente à urgência-emergência.

Atendimento de urgência e emergência da Santa Casa de Alpinópolis

Diante dessa conjuntura, instituições hospitalares nacionais e internacionais, perceberam a necessidade de efetuar uma organização na triagem do atendimento, como fator estratégico para a otimização da assistência médica. Assim, reunindo dados e cruzando informações, no ano de 1997, o médico Kevin Mackway-Jones criou o Protocolo de Manchester. A metodologia do cientista britânico vinha estabelecer diretrizes de classificação de urgência para todo o Reino Unido. O documento discriminava, por meio de cores, o grau de gravidade do paciente, que seria avaliado por perguntas-chave e classificado de forma objetiva por enfermeiros ou qualquer outro profissional gabaritado dentro dos parâmetros estabelecidos.

 
Aparelho utilizado para a triagem de pacientes no hospital de Alpinópolis

Logo o modelo inglês foi adotado por vários outros países europeus, mas só chegou ao Brasil em 2008, sendo Minas Gerais o primeiro estado da federação a implantá-lo. Em nossa região, Alpinópolis foi uma das cidades pioneiras na adoção do protocolo, passando a utilizá-lo em 2011 no pronto atendimento do Hospital Cônego Ubirajara Cabral. A adesão foi formalizada pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Alpinópolis através do Ofício 050/2011 enviado à Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Nesse documento, a entidade oficializou que iniciaria em 17 de outubro de 2011 a Classificação de Risco em Urgência e Emergência com Protocolo de Manchester, uma vez que os profissionais se encontravam devidamente certificados pela GBCR (Grupo Brasileiro de Classificação de Risco) para desenvolverem as funções.

Pulseiras do Protocolo de Manchester – VERMELHA (0 minutos), LARANJA (10 minutos), AMARELA (60 minutos), VERDE (120 minutos) e AZUL (240 minutos)

Por determinação da Resolução Estadual 3.140 da SES-MG, que cita o município de Alpinópolis (clique aqui para acessar o documento), o atendimento deverá ser implantado em todas as equipes municipais de saúde, sob pena da prefeitura perder os recursos do Programa Saúde em Casa. Segundo informações cedidas pela Superintendência Regional de Saúde de Passos, todas as 24 cidades de sua jurisdição já aderiram e, caso haja alguma desistência, as desertoras ficarão praticamente isoladas da rede de urgência e emergência, além de perderem as verbas vinculadas ao supracitado programa.

O FUTURO DO PROTOCOLO DE MANCHESTER  EM ALPINÓPOLIS

Fato indiscutível é que o Protocolo de Manchester vem provocando polêmica e dividindo opiniões entre os habitantes de Alpinópolis e, como não poderia deixar de ser, durante a campanha política o assunto foi colocado na pauta dos candidatos. O prefeito eleito Julio César Bueno da Silva, o Julio Batatinha – PTB, afirmou durante o debate realizado entre os então candidatos à prefeitura, que tinha pleno conhecimento da nova metodologia em funcionamento no município. Na mesma oportunidade, disse que o sistema não funciona bem na Santa Casa de Misericórdia de Alpinópolis e que a população supostamente estaria sofrendo humilhação em função do serviço prestado, sendo obrigada a esperar o atendimento por muito tempo e que isso tem gerado muitas ocorrências policiais contra a entidade. Fez também um compromisso com o povo alpinopolense de rever o atendimento no local e, inclusive, deixou clara a possibilidade de serem retiradas as pulseirinhas, caso esse atendimento não passasse a ser executado da maneira correta. (clique aqui para ouvir o referido trecho do debate)

O QUE DIZ A SANTA CASA

O provedor da Santa Casa de Misericórdia de Alpinópolis, Herculano José dos Reis, o Dunda , disse que o hospital não abre mão do Protocolo de Manchester, não tendo o chefe do executivo poder para subtraí-lo daquele local, sendo essa uma prerrogativa exclusiva da diretoria da entidade. Rebateu ainda as críticas feitas em relação aos procedimentos dizendo que não houve sequer um único BO (boletim de ocorrências) registrado em função de atendimento relativo ao protocolo e que o serviço ali oferecido não causa nenhum tipo de humilhação aos usuários.

Herculano Reis (Dunda), provedor da Santa Casa

“A implantação do Protocolo de Manchester no pronto-socorro do hospital foi uma decisão da diretoria da entidade e nós não abriremos mão disso em hipótese alguma. Muito me admirou ouvir o prefeito eleito, que na oportunidade era ainda um candidato, usando no debate da rádio termos como ‘o atendimento (no hospital) será revisto’, ‘as pulseiras do hospital poderão ser retiradas’ e ‘o procedimento tem que ser feito de forma correta’. O prefeito não tem autonomia nenhuma para fazer nada disso dentro do hospital, pois ali quem determina as coisas é tão somente a diretoria. Outra coisa da qual discordo integralmente são das acusações de que pacientes poderiam estar sendo humilhados em função do atendimento recebido no pronto-socorro e que também são registrados vários ‘BOs’ (boletins de ocorrência) contra o hospital. Não acontece nem uma coisa nem outra  em decorrência da triagem estabelecida pelo novo sistema. Infelizmente chego à conclusão de que o prefeito eleito desconhece tanto os procedimentos do Protocolo de Manchester quanto a maneira com que os profissionais da saúde que ali trabalham desempenham suas funções. Foram declarações infelizes e sem consistência alguma”, afirmou o provedor.

O administrador hospitalar Denilson Figueiredo

Já o administrador hospitalar da Santa Casa de Misericórdia de Alpinópolis, Denílson Vaz de Figueiredo, disse que a concretização do procedimento no pronto atendimento, se deu através da assinatura de documentação pertinente pela diretoria do hospital, uma vez que os trâmites legais haviam sido cumpridos pelo poder público municipal, já havendo o termo de compromisso sido assinado pelo atual prefeito e pela então secretária de saúde. Segundo ele, houve interesse por parte da diretoria em estabelecer o protocolo no pronto-socorro do hospital e o resultado dessa ação tem sido bastante satisfatório.

“A Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Alpinópolis é uma entidade filantrópica independente e com autonomia para aderir ou não ao Protocolo de Manchester. Como o prefeito atual já tinha assinado o termo de compromisso com o governo do estado para implantação na rede de atenção primária, a diretoria decidiu implantar no hospital também, por entender que isso significava um grande progresso. O diálogo com o prefeito é importante, pois o município sendo responsável pelo atendimento de urgência e não dispondo de um pronto-socorro municipal próprio, compra esse serviço do hospital. Isso torna um bom relacionamento entre as partes de grande importância para um andamento regular das coisas. Porém o fato de haver um convênio entre prefeitura e hospital, não dá ao prefeito o direito de interferir nas decisões internas da irmandade, sendo isso da alçada exclusiva da direção da Santa Casa. Resumindo: manter ou retirar as pulseirinhas do pronto-socorro não depende do prefeito e sim da diretoria do hospital.

Quanto à qualidade do atendimento que a população vem recebendo após a adesão ao protocolo, é visível a melhora. Não há nenhum registro de ocorrência policial por conta do novo sistema. Estatísticas mostram que não foi registrada nenhuma piora no quadro de usuários em função da espera e, graças a Deus, nunca houve óbito de pacientes que aguardavam atendimento.

Outro grande progresso que temos notado com a implantação do protocolo é ver a população, aos poucos, entendendo melhor qual é a verdadeira função de um pronto-socorro. As pessoas estão compreendendo que aquele não é o local para atendimentos ambulatoriais e consultas, que isso é feito nos PSFs e nos postos de saúde. Quando a triagem seleciona para o paciente uma pulseira da cor verde (2 horas) ou azul (4 horas), isso geralmente significa que o procedimento não é necessariamente de urgência e que pode perfeitamente ser realizado em um dos ambulatórios ou no PSF. Assim, o usuário recebe o atendimento e é encaminhado a estes lugares sem maiores problemas. É importante ressaltar, que existe um acompanhamento dos enfermeiros durante a espera, e caso haja necessidade, o paciente é reclassificado e poderá ser atendido em menor tempo”, aponta Denílson.

O DEPARTAMENTO MUNICIPAL DE SAÚDE

Juliana Pimenta, diretora do Departamento de Saúde

A diretora do DMS (Departamento Municipal de Saúde), Juliana Silva Pimenta, informou que logo os usuários que procurarem atendimento nas equipes de saúde da família, serão recepcionados de forma diferente. Isso porque a prefeitura também está adotando o Protocolo de Manchester como instrumento de triagem na atenção primária. Os Programas de Saúde da Família do município já receberam o software e os equipamentos necessários para a implantação do Acolhimento com Classificação de Risco, segundo consta na Resolução SES-MG 3.140. De acordo com a diretora, os profissionais estão sendo treinados e capacitados para que estejam aptos a operarem o novo sistema de triagem que começará a ser utilizado ainda este ano.

“As unidades de saúde da família do município já estão praticamente prontas para utilizar o protocolo, sendo que já receberam o equipamento e os funcionários já estão sendo devidamente treinados. Um ponto interessante a ser ressaltado é que esse novo método poderá melhorar o acolhimento dos pacientes que muitas vezes já chegam emocionalmente fragilizados para o atendimento. O município está cumprindo com sua parte e proporcionando as adaptações pertinentes para colocar em prática as inovações do Protocolo de Manchester”, disse Juliana.

O CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE

O presidente do Conselho Municipal de Saúde de Alpinópolis, Thales Morais, disse que o Protocolo de Manchester teoricamente veio para organizar o atendimento nas unidades de saúde do município. Declarou ainda que vê com bons olhos a maneira como todo o processo está acontecendo em Alpinópolis e espera que a metodologia sirva também como uma ferramenta educativa, pela qual os cidadãos se conscientizem do uso adequado do aparato de saúde disponível na cidade.

Thales Morais, presidente do Conselho de Saúde

“Entendo que, em teoria, o protocolo poderá ter a força de organizar o atendimento de saúde pública em Alpinópolis. Vejo que a implantação está acontecendo de forma adequada na rede municipal assim como na Santa Casa. O método exigido pelos parâmetros do protocolo poderá trazer um benefício enorme para a cidade, que é a conscientização da população em relação a prestação de serviços de saúde. Claro que toda novidade traz consigo uma carga de desconfiança por parte dos cidadãos e podemos ver isso em pacientes que reclamam quando recebem uma pulseira verde ou azul no pronto atendimento do hospital e são obrigados a aguardar 2 ou 4 horas para serem atendidos. Mas quando esses usuários começam a entender a dinâmica do funcionamento do sistema de saúde, passam já a procurar diretamente o atendimento ambulatorial ao invés de ir ao pronto-socorro. Teoricamente, as inovações trazidas pelo Protocolo de Manchester tem tudo para dar certo. Nos resta aguardar e ver o resultado final”, declarou o presidente.

O PREFEITO ELEITO

Julio Batatinha foi procurado por nossa reportagem para comentar o assunto. No entanto fomos informados, por membro da  sua equipe de transição, que o prefeito eleito apenas se manifestará após a posse.

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