Justiça suspende indeferimento e mantém aluno de Alpinópolis por cota na UEMG

O juiz da Comarca de Alpinópolis, Claiton Santos Teixeira decidiu nesta quarta-feira, 30, pela suspensão da decisão da Comissão de Identificação da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), mantendo os efeitos da auto-declaração feita pelo vestibulando Eder Raniel da Silva para ingresso no curso de Direito na Unidade Passos.

Com a decisão, o requerente tem direito ao retorno ao curso de Direito na vaga reservada aos negros/pardos, a ser feito no prazo de 5 dias, sob as penas da lei. O juiz decidiu também os benefícios da Assistência Judiciária.

No caso, Teixeira pediu à Uemg a concessão de tutela antecipada, qual seja, para que Eder Raniel da Silva seja permitido a dar o prosseguimento na vaga do Curso de Direito (Bacharel). “Ao que parece, ao menos nesse juízo perfunctório, o requerente logrou êxito em comprovar ser negro ou pardo e que não pode aguardar o julgamento final do mérito do pedido. Há vários casos em que o candidato passa de aprovado para excluído do curso, como o presente, mas se trata de uma situação complexa, não objetiva e muito relativa, havendo equívocos em algumas comissões, sendo cada vez mais recorrentes”, explicou o juiz.

Ainda conforme salientou o magistrado em sua decisão, apesar de o Poder Judiciário permitir a existência de Comissão de Heteroidentificação, o próprio Superior Tribunal Federal afirma que o papel destas Comissões é evitar fraudes, e não se transformar em banca racial.

“É certo que a avaliação envolve certa subjetividade na aferição de traços fenótipos e tal resultado pode variar. No entanto, isso não justifica a reprovação de candidatos que têm certeza de sua raça e que assim se identificam. É de suma importância a análise da família do candidato e demais fatores que complementam o processo, sendo que cumpre destacar também que não houve de acordo com o e-mail, ora anexado, decisão devidamente fundamentada para o não reconhecimento de Eder Raniel da Silva como negro/pardo, ao menos por ora. Ademais, verificando as fotos é nítida a demonstração de traços físicos como cor da pele, nariz largo, lábios roxos e grossos, estrutura óssea (arcos zigmáticos e testa) proeminentes, entre outros, requisitos estes que se enquadram perfeitamente no que se diz ser negro/pardo, além da demonstração da família do requerente, que também, e a princípio, é negra/parda”, sentenciou.

Para o juiz, ainda há outro fato a ser considerado, que é com relação à quantidade de vagas para negros, que foi a mesma de inscritos, não trazendo nenhum prejuízo a terceiros, sendo assegurado o número determinado no Edital.

“Por fim, há de se salientar que a entendimentos no sentido de que a autodeclaração do candidato presume-se verdadeira e, em caso de dúvida, ela prevalecerá. Portanto, faz-se necessária, ao menos por ora, o deferimento da tutela de urgência pleiteada, eis que se não deferida o autor terá prejuízos irreparáveis, pois está impedido de continuar o Curso. Friso que o deferimento da tutela antecipada em nada prejudicará o réu e, caso, ao final, o pedido seja julgado improcedente, o autor será excluído do curso, com as consequências de praxe”, assegurou.

A ação foi proposta pela advogada Giovanna Prado Arede de Almeida, no dia 23 de junho de 2021, em favor de Eder Raniel da Silva contra a Universidade do Estado de Minas Gerais. Conforme a ação, o jovem se inscreveu com a nota do Enem em novembro de 2020 no Programa de Seleção Socioeconômica de Candidatos (Procan) para ingresso no curso de Direito da Uemg, sendo que a universidade oferece em se edital vagas para esta modalidade. Para o curso de Direito, foram ofertadas 29 (vinte e nove) vagas para as modalidades dentro do Procan.

No dia 11 de maio o estudante foi matriculado e vinha assistindo às aulas e realizando as atividades propostas pelos professores, tendo inclusive, escolhido para ser representante de turma.

Porém, no dia 18 de maio foi convocado para fazer a confirmação do procedimento de heteroidentificação da Cota Racial através de videoconferência com os membros da Comissão de identificação, via Microsoft Teams. A Comissão entendeu por bem declarar o requerente como inapto para a categoria assinalada, ou seja, considerando-o não negro ou pardo. A resposta foi enviada por email ao estudante.

Não satisfeito, o aluno apresentou recurso ao indeferimento do procedimento de heteroidentificação, como de direito, solicitando que fosse feita a avaliação de maneira presencial para descartar qualquer dúvida ao pertencimento na vaga reservada para negros, o que não ocorreu. E, mesmo com argumentos sólidos e fotos juntadas o recurso também foi indeferido, sem qualquer justificativa plausível ou atendimento do pedido do autor de nova avaliação.

Além deste caso da Unidade Passos, a Uemg teve outros dois recursos, um da Unidade de Belo Horizonte, para o curso de Pedagogia, que foi deferido e outro para o curso de Direito de Diamantina que também foi indeferido. A advogada apresentou na ação fotos do aluno desde a primeira infância, de seus familiares e na idade adulta para comprovar, junto à Justiça, que ele é negro.

Em entrevista, Eder Raniel da Silva afirmou que o fato ocorrido com ele não é desejável a ninguém. “O fato de eu ter sido avaliado por pessoas semelhantes ao meu tom de pele, com os mesmos fenótipos e ter sido indeferido. Todo o ocorrido me entristeceu e me fez pensar que em pleno século 21, sofremos sim com a indiferença, com a desigualdade e saliento o que o juiz citou em sua decisão, o intuito da comissão de heteroidentificação é evitar fraudes e não se tornar uma banca racial. Ainda bem que podemos nos amparar no Direito, que resguarda o que é atribuído e garantido por lei”, salientou.

Fonte: Folha da Manhã

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