Espetáculo “Ventania” (1996) retrata universo do dramaturgo alpinopolense Zé Vicente

Alcides Nogueira, Zé Vicente e Gabriel Villela na estreia da peça "Ventania"
Alcides Nogueira, Zé Vicente e Gabriel Villela na estreia da peça “Ventania”

O renomado e internacionalmente conhecido diretor teatral carmelitano Gabriel Villela (à direita) que, diga-se de passagem, tem “um pé na Ventania” (sendo sobrinho do antigo líder político Isaac Vilela), na segunda metade dos anos 90 definiu a peça “Ventania”, um musical escrito por Alcides Nogueira (à esquerda) em que sexo, drogas e rock’n’roll fazem o trinômio de sustentação; como “um banho de sangue”. A peça, que estreou no Rio de Janeiro em 1996, teve como homenageado um alpinopolense ilustre e, infelizmente, quase desconhecido pela maioria de seus conterrâneos: o brilhante dramaturgo José Vicente de Paula ou simplesmente Zé Vicente (ao centro), um dos mais importantes nomes da dramaturgia dos anos 70 e autor de pérolas do teatro como “O Assalto” e “Hoje é Dia de Rock”.

A PEÇA “VENTANIA”

Quem teve oportunidade de assistir ao espetáculo pode ver, além das alegorias e metáforas barrocas de Gabriel Villela e do texto cortante e rasgado de Alcides Nogueira, um merecido resgate ao nosso ilustre concidadão Zé Vicente que, injustamente, havia sido colocado à margem do espaço teatral nos anos 90.

Apesar do nome sugestivo para qualquer alpinopolense, “Ventania” não foi uma peça biográfica e nem uma referência direta a Alpinópolis, terra natal de Zé Vicente, mas sim uma obra que propiciou uma boa leitura do conturbado universo do dramaturgo. A história de uma família, com uma mãe morta que renasce para contar sua trajetória e de seus três filhos, sendo orientada por uma força divina que trazia a ventania, configura o ponto nevrálgico desse fantástico espetáculo.

A peça foi reapresentada em 2009 no projeto Letras em Cena, do Museu de Arte Moderna de São Paulo – Masp, sob a direção de Alexandre Stockler, trazendo à tona, mais uma vez, a distinta figura do ventaniense Zé Vicente.

ZÉ VICENTE

No ano de 2007 faleceu, de um infarto fulminante, o dramaturgo José Vicente de Paula, nascido em 1945 na cidade de Alpinópolis, no bairro rural Angola. O artista teve sua primeira peça, denominada “Santidade”, proclamada pela crítica como “um modelo de pureza” e pelo governo militar como “subversiva e desrespeitosa” e, em plena ditadura, foi agraciado com os principais prêmios da época: Molière, Golfinho de Ouro e Associação Paulista de Críticos Teatrais – APCT.

Em 1971 chega ao ponto máximo de seu sucesso com o espetáculo “Hoje É Dia de Rock”, peça que permaneceu por longo tempo em cartaz no Rio e em São Paulo. Com este texto, recebeu seu segundo Prêmio Molière.

Em 1974 foi a vez da peça “Ensaio Selvagem”, com direção de Rubens Corrêa, e em 1977, Ivan de Albuquerque dirigiu “A Chave das Minas”. Ainda nos anos 70 escreveu “Última Peça” e “História Geral das Índias” e, no final da década, foi viver na Europa com a intenção de não mais voltar ao Brasil. No entanto não logrou ficar longe das terras tupiniquins e voltou nos anos 80, apresentando três novas peças: “Diário Íntimo”, “RocknRoll” e “Fim de Século”.

Passou por tempo conturbado quando as dúvidas da fé o atormentavam e, nessa fase, permaneceu um grande período recluso e sem escrever para teatro. Em 1982, declarou-se convertido ao cristianismo e publicou sua autobiografia, “Os Reis da Terra”.

Morreu aos 62 anos durante o sono, de parada cardíaca, em sua casa na capital paulista. O historiador José Iglair Lopes dedicou, em seu seu livro “História de Alpinópolis”, capítulo especial a Zé Vicente.

Talvez a melhor definição da arte do brilhante dramaturgo alpinopolense tenha sido a dada pelo crítico Yan Michalski, que disse: “O Zé Vicente é um artista livre. Ele escreve sem se preocupar com técnica, crítica, público ou até mesmo com uma coerência, formal ou temática.(…) Acontece que ele é um ser mutante, e se assume como tal. Por isso, em cada peça nos entrega apenas uma faceta de sua complexa estrutura humana, aquela faceta que no momento de escrever calhou ter aflorado à superfície da sua sensibilidade”.

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